ANSIEDADE DE SEPARAÇÃO
Ansiedade de separação é o conjunto de
comportamentos exibidos por cães quando são deixados sós, sendo um dos
problemas comportamentais mais comuns
O comportamento de apego é essencial para a
sobrevivência de animais sociais. É um mecanismo de coalizão social. A partir
do nascimento o filhote forma ligações com a mãe e com os irmãos da ninhada.
Posteriormente, com o início do período de sociabilização (
Poderão ser observados: defecação e micção em
localizações impróprias, comportamentos destrutivos (escavar, arranhar, morder
objetos pessoais, móveis, paredes, portas e janelas), vocalizações excessivas
(latidos, uivos e choramingos), depressão, anorexia e adipsia e hiperatividade.
Porém é preciso deixar claro que, somente os levantamentos do histórico
comportamental e do contexto em que estes comportamentos ocorrem podem
determinar um diagnóstico de ansiedade de separação.
Definições necessárias
Medo: sentimento de apreensão associado à presença
ou proximidade de um objeto, indivíduo ou situação social de risco. O medo é
parte do comportamento normal e pode ser uma resposta adaptativa. A
determinação de até que ponto o medo ou respostas de medo são anormais ou
inapropriadas deve ser feita pelo contexto em que ocorrem. O medo normal ou
anormal são geralmente manifestações graduadas, com intensidade de resposta
proporcional à proximidade ou percepção da proximidade do estímulo.
Fobia: uma resposta súbita, tudo ou nada, profunda,
anormal, que resulta num comportamento de medo extremo (catatonia, pânico).
Muitas reações de medo são aprendidas e podem ser desaprendidas com exposições
graduais. Fobias são definidas como reações de medo desenvolvidas rapidamente e
profundamente e que não são extintas com exposições graduais. Uma vez o evento
fóbico tenha sido experimentado, qualquer evento associado a ele ou a memória
deste é suficiente para gerar a resposta.
Ansiedade: uma antecipação apreensiva de um perigo
futuro ou desgraça acompanhada por um sentimento de disforia e ou sintomas
somáticos de tensão (vigilância e atenção, hiperatividade autonômica,
manifestações fisiológicas, aumento da atividade motora e tensão)
Origem e Diagnóstico
A principal característica da ansiedade de
separação é que os comportamentos indesejados estão claramente relacionados à
ausência de um ou de todos os membros da família. Ocorre quando o animal não
pode ter acesso ao proprietário. Mesmo que o animal esteja na companhia de
outras pessoas ou animais, o comportamento pode vir a se manifestar por estar
associado à ausência de uma pessoa em especial com quem o animal tem uma
"ligação muito forte". Deve-se procurar fazer diagnóstico diferencial
com outros distúrbios comportamentais e patológicos. Para isso é preciso
obter-se a história comportamental detalhada do proprietário.
O comportamento de ganir, latir e uivar no filhote
pode ser considerado normal e é o resultado da separação da mãe, visando à
reunião. Quando isto não ocorrer, o filhote fica deprimido, quieto e imóvel até
o retorno da mãe. No caso de cães adultos estes comportamentos podem se
repetir, mas são considerados distúrbios devido às conseqüências.
Cães com ansiedade de separação são muitas vezes
obedientes e bem treinados quando estão na companhia do proprietário. A
ansiedade de separação é então considerada como o resultado de um estresse pela
ausência do proprietário.
Eventos traumáticos na vida de um cão jovem podem
aumentar a probabilidade do desenvolvimento de ansiedade de separação. Estes
eventos incluem: separação precoce da mãe, privação prematura de laços com a
ninhada (filhote de cães mantidos em lojas ou abrigos para animais), uma
mudança súbita de ambiente (casa nova, ficar em um canil), uma mudança no
estilo de vida do proprietário, resultando em um súbito término no contato
constante com o animal, uma ausência de longo prazo ou permanente de um membro
da família (divórcio, morte, crianças que crescem e deixam a casa, volta para a
escola ou trabalho, férias que terminam) ou a adição de um novo membro na
família (bebê recém-nascido, novo relacionamento social ou novo animal de
estimação). O problema também pode ser o resultado de uma estadia prolongada ou
traumática na casa de um parente ou amigo, em um canil ou hotel. A ansiedade de
separação pode estar ainda associada a um evento traumático que possa ter
ocorrido durante a ausência do proprietário (explosões, tempestade, assaltos
violentos).
Não há predisposição sexual ou por raça. Cães de
rua recolhidos em canis de adoção têm predisposição à ansiedade de separação.
Os cães com predisposição a ansiedade de separação
são ansiosos, agitados e super ativos. Seguem o proprietário por todo lado,
pulam em cima dele e correm sem parar.
Muitos cães podem sentir quando seu proprietário
está para sair de casa e ficam ansiosos até mesmo antes de sua saída. Enquanto
o proprietário se prepara para sair, o cão apresenta sinais de:
Depois de um tempo variável da saída do
proprietário, os cães:
A maioria dos cães afetados fica super excitado quando o proprietário
retorna, saudando seu proprietário mais efusivamente do que o normal. Quando o
proprietário retorna, o cão geralmente torna-se extremamente ativo e exagera
suas saudações à chegada do proprietário.
Se o problema for recente e o animal não for de
temperamento extremamente ansioso, o prognóstico será favorável. Já nos casos
mais antigos de ansiedade, ou nos casos em que há associação com comportamentos
de pânico, o prognóstico é reservado.
Diagnóstico diferencial
Um cão com comportamento destrutivo deve receber um
diagnóstico diferencial. É preciso recolher a história comportamental, o foco
do comportamento, o contexto e as circunstâncias nas quais o comportamento
ocorreu. Deverão ser caracterizados o ambiente social e físico e a rotina
diária (alimentação, higiene, brincar, exercício, dormir). A história
comportamental irá informar também como ocorreu o processo de educação e
adestramento, incluindo a forma como foi realizado o treino para as eliminações
e como foram aplicadas as punições. Deve-se caracterizar a rotina dos
habitantes da casa e a forma como se dão as interações, incluindo o sociograma.
Os principais diagnósticos diferenciais devem ser
feitos de acordo com o comportamento exibido:
1. Comportamentos associados à eliminação: Falta ou
educação deficiente para eliminação. Falta de oportunidade de defecar e urinar
em local apropriado Medo ou excitação Submissão, saudação e marcação Patologias
(cistite, prostatite, gastrenterites). Cães idosos Agressividade por dominância
ou territorial 2. Comportamento destrutivo. Comportamento lúdico ou
exploratório. Mastigação de filhote. Resposta de medo. Reação a estímulos
excitatórios. Super atividade. Agressividade por dominância ou territorial 3.
Vocalização Reação a estímulos excitatórios (sonoros) Facilitação social Lúdico
Agressão Respostas de medo O exame laboratorial deve incluir urinálise, coproparasitológico,
hemograma, sorologia e hormônios da tireóide e glândula adrenal
(hiperadrenocorticismo), na dependência da história e dos sintomas clínicos
associados. É preciso pesquisar sintomas de dor. Para cães de mais de 8 anos
está indicada a colonoscopia na dependência dos sintomas. Nos casos envolvendo animais com mais
de 8 anos, os processos patológicos podem estar associados à disfunção
cognitiva geriátrica canina. Esta patologia determina lesões comparáveis a
Alzheimer humana, porém a causa não foi ainda estabelecida. Suas manifestações
incluem, além dos comportamentos de ansiedade de separação, diminuição de
obediência a comandos, irritabilidade, confusão, perda do condicionamento
associado a eliminações e alteração no padrão de sono.
Tratamento
Antes de se iniciar qualquer protocolo de
tratamento comportamental é preciso orientar o proprietário em como ocorre o
aprendizado canino. O conhecimento que temos do processo cognitivo animal é o
resultado da análise experimental do comportamento e estabelece relações
funcionais entre as variáveis comportamentais e as variáveis ambientais e
endógenas. Assim, quando se observa o comportamento de um animal, é preciso
entender que ele foi o resultado da interação destas variáveis. Se um
determinado animal apresenta ansiedade de separação, o que está implícito é o
resultado da relação da ausência do proprietário, o comportamento resultante e
os estímulos conseqüentes (condicionamento). O comportamento foi, portanto
reforçado. Então é preciso identificar quais são os estímulos reforçadores. No
caso da ansiedade de separação identificaremos estímulos antecedentes (sinais
da saída do proprietário), respostas (após um tempo determinado da saída, o cão
apresenta comportamentos inadequados tais como: destruição, eliminação
inadequada, vocalização etc.) e no retorno do proprietário haverá estímulos
conseqüentes (dar comida, fazer carinho), responsáveis pela probabilidade
futura da emissão dessas respostas. É importante ressaltar que, seja qual for o
comportamento do proprietário, se o comportamento indesejado se mantiver ou
aumentar em freqüência, este estímulo será chamado de reforço positivo. O
proprietário deve ser alertado de que, uma vez iniciado o protocolo de
modificação comportamental, ele deve se programar e se determinar a segui-lo
passo a passo, evitando qualquer falha de procedimento. Parte do tratamento
inclui a extinção do comportamento indesejado, isto é não deve haver mais a
apresentação de reforço positivo após a emissão do comportamento anteriormente
condicionado. Se o proprietário falhar poderá haver o retorno do comportamento
e desta vez ainda mais difícil de ser extinto ou modificado. Por outro lado,
pode haver estímulos conseqüentes ao próprio comportamento, então diremos que
são estímulos auto-reforçadores. Pensando nisto deveremos assegurar que o
animal tenha acesso somente a seus próprios objetos, brinquedos, e ossos. Ele
não deverá ter mais acesso a objetos pessoais ou móveis. Se precisar, pode-se
colocar uma chapa plástica nas paredes para evitar que ele as cavouque.
O princípio subjacente a toda técnica de tratamento
para fobias, medos e ansiedades consiste em permitir que um animal experimente
situações que incitem medo e ansiedade sem que fique ansioso ou com medo. Para
isso é preciso identificar quais são estes estímulos.
Os métodos para tratar ansiedade de separação
incluem: modificação da relação entre proprietário e seu animal de estimação,
exercício físico, treino para obediência, modificação dos estímulos
antecedentes e conseqüentes, prevenção e medicamentos ansiolíticos.
O sucesso do manejo da ansiedade de separação
inclui ensinar o cão a tolerar a ausência do proprietário e corrigir os
problemas associados a destruir, vocalizar, e eliminar em locais inadequados.
O cão deverá adaptar-se gradualmente a ficar só
através de exposição a pequenas partidas. Se a resposta ansiosa acontecer logo
após a partida do proprietário (dentro de 30 minutos), o cão deverá permanecer
sozinho, no princípio, durante intervalos muito pequenos (5 minutos) para
assegurar o sucesso do tratamento. O período de ausência é então gradualmente
aumentado. O proprietário deve evitar a interação enquanto o animal apresenta
comportamentos ansiosos. Deve assegurar que o cão não se ocupe com saudações
prolongadas no retorno do proprietário, gratificando ou premiando o animal
somente quando este estiver tranqüilo e calmo.
O tratamento pode ser iniciado com a dessensibilização às pistas ou
sinais que indiquem ao cão a saída do proprietário. O animal deverá permanecer
calmo enquanto o proprietário se movimenta. As pistas que antes informavam ao
cão a futura saída (estímulos discriminativos antecedentes) serão expostas ao
cão, mas não devem ser concluídas com a saída real do proprietário. Pode-se
também fazer o contra condicionamento, para isso treina-se o cão a manter-se
sentado e calmo enquanto o proprietário se movimenta e se afasta cada vez mais
até chegar perto da porta. Posteriormente este treino é feito com ausências que
serão gradualmente aumentadas. O proprietário se ausenta por tempos
progressivamente maiores, mas não lineares (2, 5, 3, 6, 4, 8 minutos), e
retorna antes que o cão manifeste comportamentos ansiosos.
As partidas e retornos deverão evitar super
estimular o cão. O cão não deverá receber gratificação ou atenção nas partidas
e chegadas. Atenção excessiva anterior à partida e no retorno parece aumentar a
ansiedade de separação. Pode-se condicionar o animal a associar a saída do
proprietário com um retorno breve e seguro. A TV ou rádio podem permanecer
ligados ou um brinquedo apropriado pode ser fornecido ao cão. Porém, é muito
importante que a pista não seja um artigo associado à ansiedade. Estas sugestões
ajudam o cão a associar positivamente o período de isolamento. Uma vez iniciado
o tratamento, o cão não poderá ficar sozinho mais do que o tempo estipulado. É
fundamental identificar se há componente de pânico associado; em caso positivo,
deve-se tratar a condição, pois o pânico está associado a estímulos específicos
e a ausência do proprietário é apenas a chave de onde parte o problema.
Medicamentos ansiolíticos auxiliam a suprimir a
ansiedade de separação. São freqüentemente usados em cães com ansiedade de
separação severa ou quando os proprietários têm que deixar o cão só por um
período longo enquanto o tratamento está
Em casos severos o proprietário pode ter também que
executar um programa de dessensibilização da dependência do cão a uma pessoa,
evitando contatos prolongados, impedindo que o animal durma no mesmo quarto ou
na mesma cama que o proprietário. Ignorar o cão por um período de tempo não
quebrará o laço afetivo com o proprietário, mas diminuirá a dependência extrema
do cão, permitindo que ele tolere sua ausência sem ansiedade. Ignorar um animal
de estimação pode ser difícil para o proprietário, mas é importante que ele
entenda que isto resultará em uma relação muito mais saudável e feliz para
ambos.
Castigos ou punições físicas só pioram a ansiedade,
por isso não são recomendados como tratamento. A punição é um procedimento que
visa suprimir rapidamente a freqüência de um comportamento por meio de um
controle aversivo. Raramente o procedimento é aplicado com planejamento e
conhecimento. As pessoas confundem punição com "castigo", sendo que o
castigo aplicado muitas vezes só serve para aliviar a ira do proprietário
contra um cão que fez algo inadequado. Como conseqüência há o desenvolvimento
de comportamentos respondentes (medo/agressividade) diante do punidor. O uso da
punição como estímulo aversivo deve ser feito com planejamento, de modo que a
punição seja aplicada imediatamente após a ocorrência do comportamento a ser
suprimido, o que é difícil, pois, no caso de ansiedade de separação, tais comportamentos
só ocorrem na ausência do proprietário.
Prevenção
Quando o proprietário inicia um relacionamento com
seu animal de estimação de maneira muito intensa, afetiva, carinhosa e por
muito tempo, mas sabe que esta disponibilidade irá mudar, deveria preparar
gradualmente o cão para essas mudanças, evitando assim a ansiedade de
separação.
Se um filhote ou um cão novo é trazido para casa, é importante evitar
situações que encorajem um apego excessivo. O cão deve ser acostumado
lentamente a ficar. Isto pode ser realizado através do "treino da
gaiola" (anexo1). Este tipo de exercício é especialmente útil quando se
sabe que o proprietário irá se ausentar por longos períodos. Outra orientação
deve alertar o proprietário a impedir que o cão o siga constantemente,
ajustando-o gradualmente a estar só em casa por um longo período. Deve-se
evitar estimular ou reforçar comportamento de brincar com outros objetos que
não os brinquedos apropriados. Todos os comportamentos que estimulem
demasiadamente o cão devem ser evitados. Todo comportamento de chamar a atenção
ou solicitar coisas ao proprietário não devem receber atenção. Os
comportamentos tranqüilos e silenciosos devem ser reforçados. Após os 5 meses
de idade o cão pode ser ensinado a sentar, ficar e esperar. Se o cão começar a
morder objetos inadequados, o proprietário deverá evitar a interação, mas se
for absolutamente necessário deve-se utilizar um spray de água imediatamente
enquanto o animal morde o objeto (estímulo aversivo). O exercício físico diário
(passeio) deve durar no mínimo 20 minutos e oferece a oportunidade da interação
tranqüila, calma, paciente e consequentemente gratificante. O passeio
possibilita ainda a oportunidade de ensinar o cão a sentar, ficar e esperar.
Anexo 1